Ao escrever este artigo, objetivamos analisar o documento elaborado em Nova Iorque pela Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, na qual estivemos em comitiva que representou o Brasil. Analisar através de critérios e condições: o Que se quer e pretende e o Que necessitamos ter e fazer para alcançar o que desejamos. No início do Documento, a ONU busca destacar, recordar, reconhecer, reafirmar e enfatiza os Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência. Destacaríamos neste espaço os tópicos:
j) Enfatizando a importância de reconhecer as valiosas e potenciais contribuições existentes construídas pelas pessoas com deficiência, a diversidade e o bem estar geral das comunidades...
l) Considerando que pessoas com deficiência devem ter a oportunidade de estar envolvidas ativamente em processos de decisão sobre políticas e programas, especialmente aqueles que as envolvem diretamente,
Muitos de nós possuímos varias habilidades cooperativas, de liderança, de organização e desenvolvimento de trabalhos específicos, que podem, sim, contribuir para a coletividade, mas na grande maioria dos casos, estes valores são perturbados e acabam por se perder ou simplesmente suas contribuições não chegam a refletir junto a seus pares ou a uma coletividade social maior. Quantos de nós, pessoas com deficiência somos os agentes de políticas e programas que também nos envolvem? Não é mesmo? Mas que, através da negação de nossos direitos fundamentais, vemos nossas essenciais ações serem usadas para outros fins, contrários ao potencial desenvolvimento de nós mesmos e de nossos pares. O tópico já constitui um grande avanço:
s) Reconhecendo a importância da acessibilidade nos ambientes físicos, sociais, econômicos e culturais, para a saúde e educação e para informação e comunicação, habilitando as pessoas com deficiência a desfrutar plenamente todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.
Pois destaca claramente a acessibilidade em seus vários níveis, comumente reivindicadas pelas comunidades de pessoas com deficiência em nosso Estado e País.
Chegamos aos Artigos. Nestes, o artigo 2º, que trata das DEFINIÇÕES merece uma reflexão. Acreditamos que ainda permanece uma certa confusão entre termos e definições: linguagem, comunicação, comunicabilidade, língua. Compreendemos que o artigo 2 mistura em demasia estes conceitos sem necessidade, talvez porque as pessoas responsáveis pela discussão e elaboração de conceitos e definições não possuam experiência nem formação para tal. Assim, de acordo com o artigo 2º temos:
"Comunicação" inclui comunicação oral, comunicação usando linguagem de sinais, Braille e comunicação tátil, publicações para baixa visão, áudio, multimídia accessível, leitura humana e outros modos alternativos ou aumentativos de comunicação, incluindo informação acessível e tecnologia de comunicação.
"Língua" inclui comunicação oral e linguagem de sinais e outras formas de linguagem não falada.
Reparem que consideramos que linguagem, comunicação, língua são matérias diferentes. Mas uma depende da outra para existir. Ao passo que a comunicabilidade transita por todas elas. Assim, poderíamos conceituar linguagem como sendo o significado simbólico pelo qual organizamos pensamentos e os compartimos com outros. A linguagem de sinais não entraria diretamente no rol de linguagem - apesar de esta caracterizar e construir Símbolos e Significados bastante particulares, mas que, na relação ambiental circundante, estabelecem reciprocidade - mas como língua/comunicação. O Braille estaria no rol de comunicação. As publicações em comunicabildade e acessibilidade.
Para melhor compreensão, seria uma esfera de dois direitos: direito à comunicação e direito a se comunicar. Exemplo disso seria uma pessoa Surdacega. Ela não está reivindicando, como muitos pensam, seu direito à comunicação. Ela reivindica o direito a se comunicar da maneira como sabe e como é funcional lingüisticamente (Linguagem). Para que seu direito de se comunicar de sua maneira seja resguardado e compreendido pela coletividade ela precisa de um meio para fazer a ponte. Este meio seria o guia-intérprete ou modo não-humano. Seja pessoa ou mecanismo podemos considerar como sendo a comunicabilidade. Comunicabilidade e acessibilidade são termos muito parecidos.
Esta reflexão pode referir-se às outras condições e grupos de deficientes. Assim, também é muito contraditório considerar língua como sendo qualquer forma de linguagem não falada.
No Artigo 4, OBRIGAÇÕES GERAIS, podemos destacar e perceber avanços como no caso do item (g) onde lê-se:
Fornecer informação acessível para pessoas com deficiência sobre Aparelhos para mobilidade, instrumentos, tecnologias assistivas incluindo novas tecnologias, assim como outras formas de assistência, serviços de apoio e instalações.
Este poderá nos permitir saber dos avanços tecnológicos que estão à disposição. O Brasil, apesar de país em desenvolvimento, possui grandes valores e variadas tecnologias assistivas que, usadas de forma racional, possibilitam às pessoas com deficiência, em suas variadas condições, desenvolvimento de suas habilidades e conseqüente desenvolvimento geral.
O Artigo 6, MULHERES COM DEFICIÊNCIA e o Artigo 7º. CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA dão ênfase a dois grupos de risco maior. As mulheres e meninas deficientes estão sujeitas a múltiplas discriminações. Todos sabemos da vulnerabilidade das crianças e, sendo elas deficientes, sofrem piores conseqüências. Todo deficiente adulto sabe o quão importante é a formação desde a infância. Em razão disto é que promove e valoriza as ações de agora para com crianças com deficiência.
No Artigo 8. AUMENTANDO A CONSCIÊNCIA SOBRE A DEFICIÊNCIA, podemos destacar em seu item 2, alínea (iii) que diz:
Promover o reconhecimento das competências, méritos, habilidades e contribuições de pessoas com deficiência no ambiente e mercado de trabalho.
Aqui temos um avanço. Sabemos o quanto batalhamos dia após dia pelo reconhecimento das nossas competências. Para que nosso meio reconheça e valorize nossas aptidões e não nossas condições diferentes. É urgente a mudança. Reconhecimento é direito, não é dó nem comiseração. Não precisamos de caridade do meio. Precisamos, apenas, ter nossos talentos valorizados e reconhecidos como tais.
O Artigo 9. ACESSIBILIDADE é em sua totalidade pertinente. Podemos analisar o item 2, alínea (c) que diz:
Fornecer treinamento às partes interessadas sobre as dificuldades de acessibilidade enfrentadas pelas pessoas com deficiências.
Neste caso devemos nos manter atentos à seguinte questão. O treinamento destacado pela alínea deve ser ministrado também por pessoas com e deficiência, por serem estas que possuem a experiência concreta das dificuldades enfrentadas pela acessibilidade inexistente.
Alínea (f) Promover outras formas apropriadas de assistência e apoio às pessoas com deficiência para assegurar o acesso à informação.
Esta alínea abre um bom caminho de Acesso à Informação também as deficiências mais severas e suas condições especificam:
No Artigo 21, LIBERDADE DE EXPRESSÃO E OPINIÃO E ACESSO À INFORMAÇÃO, pode-se destacar a alínea (b) que diz:
Aceitar e facilitar o uso da língua de sinais, e Braille, meios alternativos e aumentativos de comunicação e todos os outros meios acessíveis, modos e formatos de comunicação, de escolha das pessoas com deficiência, em atividades oficiais.
Aqui há se usa o termo Língua de Sinais e não Linguagem de Sinais. Destacar meios alternativos pode ser, como anteriormente, possibilitar maior acesso às pessoas com deficiências graves. Mas o real avanço diz respeito à escolha das pessoas com deficiência, ou seja, de um certo modo poderemos questionar o uso deste ou daquele meio que está sendo usado. Poderemos, assim, assegurar funcionalmente a nossa participação.
No Artigo 24. EDUCAÇÃO pode-se perceber um dos maiores avanços contidos nesta diretriz. O item 2, alínea (c) destaca:
Educar pessoas com deficiência mediante as adaptações adequadas para as suas necessidades individuais requeridas. Na alínea (d), Assegurar medidas de apoio individualizado efetivo.
O avanço consiste basicamente no plano individualizado de atenção e educação. O principal desafio de uma sociedade moderna e inclusiva é tratar todos de uma forma individual, respeitando suas características únicas, porém, inseridos em um todo comum. A alínea (c) destaca:
Assegurar que a educação das pessoas, especialmente das crianças que são cegas, surdas e cego-surda, seja realizada nas línguas, modos e meios de comunicação mais apropriados para o indivíduo, e em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social.
Neste tópico, mantém-se a individualização do processo, o que nos casos das pessoas surdacegas (na diretriz lê-se cego-surdas) é essencialmente pertinente, visto as características específicas que a deficiência nos sentidos superiores – audiovisuais - ocasiona.
Conclusão
Destaque-se que as presentes observações têm por base critérios estritamente pessoais e método-empírico-cientifico. São nítidos os avanços da presente Convenção com relação às diretrizes anteriores. Passos relevantes no rumo da atenção às especificidades foram dados. Quanto mais específicas diretrizes e normas, mais serão verdadeiras e funcionais as ações frente às deficiências. A busca constante do funcional é importante e fundamental: as pessoas deficientes e seus comportamentos acima da técnica e das limitações impostas por estas. Obviamente que toda a análise tem suas discordâncias. Estas ficaram claras em nossa preocupação com as Definições de Língua e Linguagem. Acreditamos que podemos, sim, ser ainda mais claros e específicos com relação a isso. Mas, para tanto, precisamos que mais pessoas também com as mesmas especificidades possam participar das discussões e elaboração das Diretrizes. Talvez seja uma utopia pensar ou sonhar, mas sonhar é permitido. Sonhar que um dia possamos construir o Documento Brasileiro, por exemplo, tendo como agentes deste processo, pessoas com deficiência, cada qual representando seu segmento e categoria, o que hoje não ocorre. Assim, poderíamos resguardar a todos a relação causal e o sentido fático de suas experiências concretas. Não sou eu somente que está apontando este caminho. A própria Convenção o apontou e destacamos isso no inicio desta analise. Quem sabe este sonho se torne realidade para uma próxima Convenção, não é mesmo? Agora basta encaramos o futuro. Amparados em mais esta Diretriz, buscarmos nossa autonomia e melhor qualidade de vida, de forma individual e coletiva.
Prezado leitor, confira este e outros belíssimos artigos acessando o Portal do Planeta Educação http://www.planetaeducacao.com.br Coluna Aprender com as Diferenças
No Portal da SEACIS acessando diretamente http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/seacis/default.php?reg=6&p_secao=21
O Artigo em Inglês no Portal da Word Federation Of Deafblind seguindo os passos: http://www.wfdb.org > News > International disability news > Convention Analysis > Read More = INTERNATIONAL CONVENTION ON THE RIGHTS OF PEOPLE WITH DISABILITIES : From Criterions to Conditions.